Do livro Taxitramas – Diário de um taxista, copiado lá do blog do autor:
É um assalto?
Outro dia peguei um assaltante. Não era difícil notar que era um assaltante. Apesar de mal vestido, calçava um tênis de marca, tinha, no pulso, um relógio caríssimo e usava uns óculos HB (legítimo). Na cintura, sob a camisa, trazia uma pistola 765 automática.
Claro que não notei tudo isso quando ele me fez sinal, se tivesse notado não pararia. Na verdade, ele fez questão de me mostrar e descrever item por item. Depois, ofereceu-me o relógio, o tênis e os óculos por uma mixaria. Só não vendia o seu brinquedo de furar moletom, a sete-meia-cinco.
Não comprei nada, claro, mas recusei a oferta com cuidado para não melindrar meu passageiro. Falei que a grana estava curta, que havia trabalhado o dia todo e já me daria por contente se ele não me assaltasse. Patético, cheguei a perguntar se ele ia me assaltar (!).Com a maior naturalidade do mundo, ele falou que eu não precisava me preocupar. Disse que não me assaltaria, por um motivo muito simples: ele não assaltava pobres!
Vejam só, um cidadão contraventor com princípios morais, eu pensei.
No entanto, longe de ser um Robin Wood moderno, a lógica do cara era outra. A razão de ele não assaltar pobres (incluindo nesta categoria, felizmente, os taxistas), era porque não éramos bons clientes. O cara era prático: se ele tinha que arriscar o seu regime semi-aberto à mão-armada, seria com alguém que tivesse algo a oferecer.
Cumprindo o seu discurso criminosamente correto, ele pagou a corrida e sumiu nas quebradas da Vila Maria da Conceição Degolada. No fundo, a impressão que ficou é que se tratava de uma fera bem alimentada que, naquele momento, não sentiu apetite pela féria minguada de um taxista. Menos mal.
Pois é, ainda não comprei o livro. Ainda. Mas com certeza vou comprar: as crônicas do cara são simplesmente muito boas!
(E maldito seja o blogger.com.br que não permite permalink pros posts… )