Deu hoje no Jornal da Globo: o governo brasileiro e o argentino vão assinar um acordo mútuo de produção de energia nuclear. Mais: anteontem a Comissão de Ciência e Tecnologia aprovou o projeto que cria a Política Nacional de Energia Nuclear. Sinistro, totalmente sinistro. O Brasil pode ter uma das maiores reservas de urânio do mundo, mas isso não justifica o uso de energia nuclear, que é extremamente perigosa. Tão perigosa que as medidas de segurança acabam por torná-la por demais cara. O Brasil tem uma das maiores áreas de recebimento de luz solar do planeta, resultando em energia limpa na forma de biomassa. Em vez de investir no aproveitamento de tal recurso, vem com um projeto que é perigoso e que é lento para ser implementado. Por exemplo: se resolverem retomar a construção de Angra III, que está com todo o equipamento para a sua construção já no Brasil, levará 6 anos para ela ficar pronta e começar a fornecer energia elétrica. É muito tempo… Aliás, é gozado ver a Globo colocar a questão da energia nuclear como a melhor forma de resolver o problema da crise de energia que o país está enfrentando ao mesmo tempo que mostra esses dados. É de se ficar perguntando quem é que vai ganhar com a adoção dessa política de geração de energia.
Mas falando em termos de meio-ambiente, estou relendo o Henfil na China (antes da Coca-Cola), do Henfil. Ao descrever uma visita a uma fábrica ele diz o seguinte (pg. 68):
Sentamo-nos para saber se tínhamos alguma dúvida. Tínhamos. E a poluição? Que que fazem com os resíduos de uma fábrica pesada como essa?
Bem, a poluição interna é eliminada por fortes aspiradores. E, de fato, não senti cheiro nenhum. Quanto à contaminação pelas chaminés, eles, simplesmente, não têm chaminés. Chaminés pressupõem jogar no ar os resíduos. Usam, ao contrário, filtros e reciclagem dos resíduos. Nada se perde, nem o que se perderia saindo pelas chaminés para poluir a cidade. Poluição, para os chineses desta fábrica, é sinal de desperdício!
Nem os trapos para limpar as máquinas são jogados fora depois de usados. São tratados e recuperados.
Lendo isso, e levando em conta que o Henfil esteve na China em 1977, é de se espantar ao se deparar com um artigo da revista Veja de 20/06/2001, pg. 64, onde está escrito:
(…) a China é um país de números macros, nem todos agradáveis. (…) O lixo e o esgoto produzidos por 765 milhões de habitantes das cidades chinesas são simplesmente abandonados a céu aberto ou despejados em cursos d´água. Na maior parte de seus 5400 quilômetors de extensão, o Rio Amarelo não passa de um imenso canal de esgoto contaminado com metais pesados e outros produtos tóxicos. A Organização para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO) calcula que 80% dos rios chineses estão de tal forma poluídos que os peixes desapareceram. As indústrias e usinas termelétricas, movidas a carvão, tornam a China o segundo maior emissor de poluentes do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Os 808 milhões de toneladas de poluentes lançados anualmente no ar correspondem a um décimo de toda a poluição atmosférica do planeta.
Nem parece que estamos falando do mesmo país. Ok, temos aí 24 anos de distância aí no meio, com direito até a um massacre na Praça da Paz Celestial, mas uma decadência tão grande se dar num espaço de tempo tão curto? Sei não, mas acho que o Henfil acabou se deixando levar pelo deslumbre e acreditou que algumas empresas refletiam todas as empresas da China. Creio que ele ficaria com cara de bunda ao ler uma notícia dessas hoje em dia. Se bem que ele ficava com cara de bunda até com as brincadeiras do Laerte…
Mas voltando à questão da ecologia, como se explica tal mudança? Bem, a China vive sob um regime socialista/comunista, ok, mas cada vez mais voltada pro consumismo. A palavra de ordem lá é dar ao povo conforto e tecnologia, o panis et circenses dos tempos atuais. Mais consumo, mais industrialização. Como industrialização com segurança ambiental torna o produto mais caro, deixa-se de lado a segurança. Resultado: essa situação que se vê hoje em dia. E o que se pode fazer para reverter tal quadro? Bem, eu sinceramente não sei, mas acredito que o fato de eu olhar para um produto num supermercado e deixar de comprá-lo por que está escrito alí Made in China, mesmo sendo mais barato, já ajuda um pouco.
E já que falamos em Henfil, aproveito a bola quicando e sugiro a leitura desses artigos da Wired Brasil: HQs: um futuro na Web? e Quadrinhos da era pós-Snoopy. Destaque especial para os links desse último…