Ensinando a valorizar profissionais

É interessante ver como as coisas funcionam nesse mundo em que vivemos… Recentemente a minha namorada Taila, que é estudante do curso de Artes Visuais – Licenciatura no Instituto de Artes da UFRGS, recebeu um email da Comgrad/ART onde foi repassada a seguinte proposta de estágio enviada por uma coordenadora pedagógica de um colégio particular de Porto Alegre (os nomes nos emails abaixo copiados foram suprimidos visto que não solicitei autorização para reproduzir os mesmos e não quero levar um processo por conta disso):

Data: 4 de janeiro de 2011 12:42

Prezados senhores,

sou coordenadora pedagógica do colegio (nome suprimido) e gostaria se possiviel fosse divulgado nesta institução que estamos oferecendo estágio não remunerado na disciplina de artes na 5ª série do Ensino Fundamnetal para a companhar a professroa titular da disciplina de Artes durante o ano letivo de 2011. Os interessados deverão enviar curriculo para (email suprimido) durante esta e a outra semana.
No agurado de sua atenção
agradeço
(nome suprimido)

(nome suprimido)
Coordenadora Pedagógica:
5ª a 7ª Série do E F

Bem, erros de digitação a parte, o que mais chamou a atenção da Taila nesse email foi o “estágio não remunerado”. Assim, ela mandou um email para os colegas delas que receberam a mensagem (sim, a Comgrad/ART não sabe usar BCC) expressando a revolta dela com o fato de que uma escola particular, isto é, que cobra (e bem) dos seus alunos, oferecer um estágio não remunerado. Vários colegas dela concordaram, colocaram seus pontos de vista e uma tomou a iniciativa de mandar um email para a coordenadora reclamando sobre a não remuneração, recebendo assim a seguinte resposta:

(nome suprimido), acredito que me fiz entender mal quando oferecei um estágio não remunerado. Procuramos um auxiliar para  turmasd de 30 alunos e que queiram auxiliar a  professora titular nas aulas de arte. Muitas pessoas nos procuram por que não tem a prática necessária para atuar em escolas , principalmente nas particulares e gostariam de trer esta prática. Esta é uma oportunidade que a escola abre para estas pessoas. Já recebemos currículos de colegas teus que manifestaram desejo de participar desta oporunidade. Pelo visto não é o seu caso. Mesmo assim continuamos buscando alunos  que queiram aprender conosco, mesmo numa situação como esta.

Atenciosamente
(nome suprimido)

Essa resposta deixou o pessoal mais nervoso, afinal, como apurou uma colega da Taila, para o estágio não obrigatório é compulsória a concessão de bolsa ou outra forma de contraprestação que venha a ser acordada, bem como a concessão do auxílio-transporte.  Portanto é contra a Lei de Estágios contratar para estágio não obrigatório e não oferecer remuneração, assim como auxílio transporte (que não necessariamente tem que ser o valor integral dos gastos com passagens). Essa informação foi repassada para a  coordenadora, que respondeu o seguinte:

(nome suprimido), realmente  eu me equivoquei e não sabia da lei de estagios. Foi num impulso que enviei o e-mail para este Instituto de não podia imaginar que isto fosse causar uma revolta tão grande. Desculpe.  Fica combinado, então,  que não entrevistaremos os teus colegas que enviaram curriculo e se apresentaram para a vaga. Nossa intenção nunca foi de abusar dos  estudantes de qualquer disciplina . Acredito que todos temos que buscar nossos direitos. Não nunca pensamos em obter maão de obra barata , nossa intenção como já disse era oferecer um local para quem quisesse adquirir a  experiencia tão necessária quando da contratação de professores , principlamente nas escolas particulares.
Se quiseres podemos marcar uma entrevista , em março para conversarmos mais sobre este assunto, inclusive sobre orçamentos.

Um abraço
(nome suprimido)

Olha, quando a Taila me leu esse email eu não consegui conter meu espanto… Afinal, como assim “Fica combinado, então,  que não entrevistaremos os teus colegas que enviaram curriculo e se apresentaram para a vaga.”? Como assim “os teus colegas”? Primeiro, não deveria haver entrevista alguma, não enquanto não fosse definida uma forma de remuneração para esses estagiários. Essa coordenadora pedagógica não parou para pensar que se ela for adiante está fazendo com que a instituição onde ela trabalha cometa um crime? Não, pelo jeito não. Ela deve realmente acreditar que está ajudando os alunos de licenciatura, com o velho argumento do “adquirir experiência”, indo contra o que a escola prega, que é ter um currículo “organizado com ênfase na construção do conhecimento científico, norteado pela ética, a cidadania, a solidariedade e a responsabilidade social” (sim, esse texto está no site do colégio…).  Além disso, foi só para mim que essa mensagem passou a idéia de “ah, resolveu reclamar? Então explique você para os seus colegas porque não estamos aceitando ninguém daí”?

Mas sabe o que é mais irônico nessa história toda? É que justo essa semana está tendo vestibular na UFRGS, e o tema da redação é sobre a diminuição da procura pela profissão de professor e o que pode ser feito para reverter isso. Bem, posso dizer que, para começar, uma coisa que pode ser feita para começar é as escolas valorizarem os futuros profissionais de licenciatura, não acenando com o argumento de “adquirir experiência” e “engordar o currículo”. A única coisa que isso ajuda é a reforçar a idéia de que professor existe para ser explorado, e nada mais.

O revoltante auxílio-reclusão

Costumo no Twitter ver ocasionalmente críticas ao auxílio-reclusão. Normalmente é algo desse tipo:

É, de fato é revoltante isso… Afinal, lá está você honestamente dando duro, suando, para ganhar uma merreca, enquanto o cara que matou, estuprou, e fez o diabo a quatro tá lá no bem bom sem fazer nada ganhando mais do que você… Sim, é extremamente revoltante.

Só que não é bem assim.

Para começar o auxílio não é para o preso. Esse está lá, encarcerado, sendo mantido pelo Estado. Por pior que seja o crime é função do Estado trabalhar na reabilitação do criminoso, e isso não é possível sem que o mesmo seja mantido vivo. Assim, ele recebe o necessário para as suas necessidades fundamentais. O problema não está aí, o problema está em quem depende de quem está preso.

Vamos criar um caso hipotético para ilustrar: José é casado com a Maria e tem um filho de 12 anos, o João. Ele é um cara trabalhador, mas tem um defeito: é muito esquentado. E um dia ele brigou com o Pedro e… bem, matou o Pedro. Como o José é um cara esquentado, e não é a primeira vez que é preso, ele é encarcerado, sem direito à esperar o julgamento em liberdade. E agora vem a pergunta: como ficam nessa história a Maria e o João? Pois é, a Maria até tem o seu emprego, mas se antes com o José trabalhando junto não dava para se manter direito imagine agora. E tanto a família do José como da Maria não são da cidade onde eles moram, de forma que não há familiar por perto para quem recorrer. Pois bem, é para a Maria e o João que existe o auxílio-reclusão. Enquanto o José estiver preso, sem poder prover o sustento da sua família, esta vai receber um auxílio da previdência.

É como disse o Mozart Victor Russomando no “Curso de previdência social” (p. 294-5, 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983):

“O detento ou recluso, por árdua que seja sua posição pessoal, está ao abrigo das necessidades fundamentais e vive as expensas do Estado. Seus dependentes, não. Estes se vêem, de um momento para o outro, sem o arrimo que os mantinha e, não raro, sem perspectiva de subsistência.”

É para isso que serve o auxílio-reclusão: para ajudar os dependentes, não o preso. Dizer que com um auxílio desses vai aumentar a criminalidade é fechar os olhos para o fato de que com isso está se evitando que o João aí da história vá “dar um jeito” (vale lembrar que pelo Estatuto da Criança e do Adolescente o João não pode trabalhar… então, como é que ele vai arranjar uma graninha?) para ajudar no seu sustento e da sua mãe.

E quanto ao valor, o detalhe é o seguinte: o salário mínimo pode ser de R$ 540, mas esse é o piso do salário mínimo, enquanto os R$ 810 são o teto do auxílio. Segundo o INSS o valor médio recebido por família é de R$ 580,00 por mês, o que quer dizer que tem gente que recebe menos que o salário mínimo. Dá para entender isso quando se leva em conta que o valor do auxílio-reclusão a ser concedido corresponderá ao equivalente a 100% do salário-de-benefício pago pelo contribuinte no momento em que ele foi preso. Ou seja: se ele recebia um salário de R$ 670 e pagava a contribuição sobre esse valor ele receberá a quantia de R$ 670. Sim, o mesmo que ele ganhava de salário! Olha, não quero dizer nada, mas se alguém aprontar uma para ir preso em um das maravilhosas prisões brasileiras   para ganhar esse auxílio por causa do dinheiro ele realmente merece ir preso, mas por burrice.

Então, antes de dar o retweet dessa besteira aí em cima pare e pense. Assim você vai ver que esse auxílio aí não estimula o aumento da criminalidade, mas sim ajuda a diminuir o mesmo.

Nem tudo o que é dourado é ouro

Pirita é um mineral ferroso que, devido ao seu brilho metálico e à cor amarelo-dourada, é conhecido como ouro-de-tolo. Se você acredita no poder curativo dos cristais (o que não é o meu caso) você pode comprar uma pedra de pirita pesando entre 200 e 250 gramas por uns R$ 80 (praticamente o mesmo valor de um grama de ouro),  tratando assim problemas na flora intestinal, juntas, cabelo, pele, sistema nervoso, plexo solar, caminhos da respiração, brônquios, pulmões e distensões. Pode também usar o mineral para resolver problemas psíquicos, como medo de exames, problemas de relacionamento, autoconsciência, moléstias psicossomáticas e, principalmente, depressões e frustrações.

Pois é, pelo jeito o Marcelo Dourado, vencedor do Big Brother Brasil 10, vai precisar de uma pedra dessas… Afinal ele torrou todo o prêmio de 1 mihão e 500 mil reais que ele ganhou em menos de um ano. Isso dá cerca de 120 mil reais por mês. Diz ele que gastou com familiares e com a sua marca de roupa, mas também largou essa: “Eu tenho namorada, então gastei rápido. Eu jogo jogos de azar. Todo o dinheiro já era. Eu quero trabalhar para poder pagar minha contas. Já estou devendo.”. É amigo…

Sabe, eu costumo jogar volta e meia na Mega Sena, Lotomania, etc. Sei muito bem que a chance de ganhar um desses prêmios é minima, mas levando em conta que é mínima a chance de juntar um milhão com o dinheiro que eu gasto nas apostas encaro como sendo “elas-por-elas”. Sabe aquela conversa do Débi & Lóide onde o Lloyd Christmas pergunta para a Mary Swanson se ele tem uma chance em um milhão e ela responde um talvez, o que faz com que ele grite alegre “Eu tenho uma chance!”? Pois é esse o espírito. Tolo, sem dúvida, mas divertido, e é dentro desse espírito que eu costumo viajar pensando em como gastaria esse dinheiro. E se tem uma coisa que eu já percebi nesses devaneios é que, apesar de soar bonito, um milhão não é tanto dinheiro assim.

Não, não é. Está certo com um milhão de reais na poupança você pode viver bem, tirando cerca de 5 mil reais por mês, o que já faz muita gente pensar em parar de trabalhar (e de fato a idéia é tentadora), porém isso está longe, muito longe, de ser rico. Pense em algo que fuja do dia a dia (comprar um helicóptero, ter uma lancha, ter um apartamento à beira-mar em Copacabana) e você vai ver que 1 milhão é pouco. Se você pensa em viver na farra então, um milhão é um nada. Taí o Dourado para provar.

Fosse o cara esperto ele pegava essa grana, separava um terço para criar uma base sólida de vida (afinal com 150 mil você ajuda na buena sua família e com 35o mil você compra um belo de um apartamento e equipa ele bonito com geladeira Brastemp, TV de 50 polegadas, uns e outras regalias) , de forma que teus gastos a partir daí serão de manutenção, e mete o resto na poupança, tirando aí um boa grana para complementar teu salário. Se o salário for muito baixo, se diminui o gasto com a família e a casa própria para uns 300 mil reais e se gasta uns 100 mil montando um negócio, mantendo uns 100 mil engatilhados para manter o mesmo até engrenar. Isso tirando uns 5 mil por mês para se manter. Essa é uma forma racional de usar o dinheiro, não?

Opa! Pára tudo! Eu estou esperando que o Marcelo Dourado seja racional? Isso sim é que é tolice!

10 anos hoje

E eis que esse blog completa hoje 10 anos. São 10 anos onde esse blog passou por textos quase diários, por projetos paralelos, pelo quase abandono do blog e troca pelo Twitter e por aí vai… Foram 10 anos em que fiz muitas amizades, em que me diverti muito, em que cresci profissionalmente e onde conheci a pessoa mais doce da minha vida. Foram 10 bons anos, e torço para que os próximos 10 sejam tão bons quanto. 🙂